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O clima da roda de samba, a memória afetiva das sucessos românticos, o molejo para lidar com a transmissão ao vivo: tudo isso fez o pagode se encaixar bem na nova paixão brasileira pelas lives.
Que o sertanejo lidera, todo mundo já sabe. Mas quem olha só para os ídolos da sofrência não está vendo uma surpresa pagodeira…
O pagode tem uma moral que as paradas recentes não mostravam. Das 20 lives individuais mais vistas que estão no ar, ele só perde para o sertanejo, e deixa para trás funk, forró, pop e eletrônica.
Disparou a audiência de Raça Negra, Sorriso Maroto, Thiaguinho, Alexandre Pires, Péricles e Pixote. Dilsinho e Ferrugem, que têm mais hits atuais, vêm um pouco atrás. O povo quer ouvir mesmo “as antigas”.
Na história da música brasileira, é claro que essa força do pagode não surpreende. Mas no contexto atual, dos hits de streaming, o ritmo tem presença muito mais tímida do que agora, durante as lives.
Sucessos de pagode até aparecem recentemente, mas bem longe do sertanejo, líder absoluto, e do funk, muito presente nos últimos anos. Por isso é uma surpresa esta força nas transmissões.
O G1 falou com ídolos do pagode que explicam o fenômeno duas formas muito diversas: tem a análise técnica do Bruno, do Sorriso Maroto, e a explicação de coração do Anderson, do Molejo.
Bruno Cardoso aponta como trunfo a constância dos pagodeiros no cenário musical, mesmo fora do auge comercial de vinte anos atrás. Quer repertório conhecido e longo? Os grupos de pagode têm.
Mas se o Sorriso Maroto e seus colegas do pagode romântico já iam relativamente bem no YouTube, o resultado positivo virou passeio com as lives de abril.
Já Anderson, do Molejo, tem uma explicação excêntrica: “Para o brasileiro, pagode é igual mortadela”. Ele explica: a pessoa não vai sair por aí admitindo que ama, mas na hora H, é tudo o que ela quer.
É como uma “confort food”, alimento que conforta nas horas difíceis – uma quarentena, por exemplo. Ele ainda exalta o jogo de cintura do pagodeiro para lidar com imprevistos nas lives: o famoso molejo.
“A gente até se prepara, mas quando conta 1, 2, 3, o Molejo lida é com aquilo que dizia Nelson Rodrigues, o Sobrenatural de Almeida. Improvisamos e mudamos o repertório na hora, mas deu certo.”
Outros que não estão no top 20, mas foram destaques, são Zeca Pagodinho e, na seara do samba e da MPB, Teresa Cristina. Mas a curva de audiência mais impressionante foi a do Raça Negra.
O que as lives de pagode mais vistas têm em comum é a nostalgia mesmo. O Sorriso Maroto deixou isso estampado na camisa: o mesmo look verde e branco do primeiro DVD deles, de 2005.
Bruno do Sorriso Maroto repetiu a roupa do primeiro DVD, de 2005 (esquerda) na live de 2020 — Foto: Reprodução
“Acho que a família brasileira em casa está revivendo memórias, buscando coisas pelas quais tem carinho, que trazem sensações boas. Isso é a semente do sucesso da lives como a do Sorriso”, ele diz.
Bruno acha que o pagode sai com mais moral da roda de lives. E não só no YouTube. “Acho que as plataformas vão ver que o pagode tem uma fatia de público que não estava detectada.”
“Isso mostrou que Sorriso Maroto e um Jorge e Mateus, por exemplo, não são tão diferentes, têm uma fatia de público similar. Mas o sertanejo é um segmento mais aquecido nas plataformas”, diz Bruno.
“Isso pode acontecer com o pagode. Basta a gente ter um pouco mais de abertura das outras plataformas. Se a gente conseguir democratizar o mercado, dá para todo mundo ter sua fatia.”